8 de julho de 2011

Pequenas ações, grandes diferenças

Maria.


Para Beatriz Hummell, são as pequenas ações que fazem a grande diferença no funcionamento de uma cidade. Nesta entrevista, a arquiteta e urbanista compartilha seu ponto de vista, conhecimento e experiência sobre seu trabalho voltado para o desenvolvimento sustentável das cidades.
Cidades Sustentáveis



O que é Redeci e como surgiu a proposta?

Vou tentar explicar bem detalhadamente a descrição da rede. A Rede Global de Cidades Inovadoras (Redeci) é uma rede social distribuída – ou seja, não tem nenhum tipo de administrador, dono ou moderador que concentre ações, decisões da rede – de pessoas – não existem perfis “corporativos” ou de pessoa jurídica. Isto é, não existe nenhum tipo de líder que fale por um agrupamento. Reafirmando, é uma rede distribuída – envolvidas com a inovação em cidades – para qualquer pessoa que esteja disposta a interagir na rede, seja com discussões, compartilhamento de experiências, matérias, novidades etc.
A Redeci surge como um espaço para possibilitar a interação de pessoas de todo o mundo para compartilhar conhecimento sobre a inovação em cidades (vide próxima pergunta).


Você fez parte do grupo que elaborou e organizou o conteúdo da Proposta de Constituição da Redeci, não é? Como foi encaminhado na prática?

A Redeci foi inaugurada durante a CICI 2010 (Conferência Internacional de Cidades Inovadoras), em Curitiba, no mês de março. 
Ela surge com uma iniciativa da FIEP (Federação das Indústrias do Estado do Paraná), a partir do Programa Cidades Inovadoras, que apóia o surgimento e a multiplicação de novos atores sociais, articulados em rede e em busca de mais sustentabilidade, equilíbrio social e maior harmonia entre o homem e o meio ambiente. 
Somado a isso, a experiência do Augusto de Franco (criador da Escola de Redes) e do Ramiro Wahrhaftig contribuiu para criar um ambiente que possibilite a qualquer pessoa do mundo expor, compartilhar e debater suas idéias e experiências sobre a inovação em cidades. Em seguida, a Suelen Trevizan e eu fomos convidadas a animar a rede (vide próxima pergunta).

Inclusive, desde o início, você é bastante participativa na rede. O que a impulsiona?
Sou animadora da Redeci. Apesar de tratar-se de uma rede distribuída – isto é, ninguém centraliza as suas ações – para uma rede online funcionar é necessário que alguém “deixe a casa em ordem”. Alguém precisa se responsabilizar por organizar coisas como a aprovação de membros, organizar os conteúdos, ou até mesmo impedir a permanência de conteúdo impróprio na rede. Como sou estudiosa da área de urbanismo (sou arquiteta e urbanista, mestre e doutoranda em Gestão Urbana pela PUCPR) também alimento a rede com conteúdos que acho interessantes e pertinentes ao tema que a Redeci se propõe a discutir, que é bastante amplo. Além disso, é um ótimo canal para conhecer pessoas da área, fazer contatos e amigos.

Também esteve envolvida com o evento CICI 2011. Poderia falar um pouquinho de sua experiência?
Comecei a me envolver com a CICI desde a edição 2010, embora não tenha participado da organização, ao mesmo tempo em que iniciei as atividades na Redeci. Já na edição 2011 participei desde as primeiras reuniões e auxiliei em algumas ações, como a indicação de nomes de palestrantes e temas e em ações de comunicação digital. É gratificante ver como o evento se desenhou de maneira tão completa e abrangente, com diversos temas pertinentes à inovação em cidades. Mais uma vez, o evento trouxe nomes importantes que irão enriquecer muito a discussão do que foi abordado pela conferência.

Cidades Inovadoras e Sustentabilidade

No cotidiano, quais  suas práticas para contribuir com os objetivos da Redeci e o Programa Cidades Inovadoras?
Atuo diariamente por meio da divulgação e compartilhamento de conteúdo, discussões com outras pessoas e até mesmo fazendo novos contatos, por meio da Redeci e redes sociais. Acredito que a informação é o meio mais eficaz para conscientizar as pessoas dos problemas urbanos vivenciados atualmente. Pelo fato de a internet ser um meio livre e gratuito, acho que é também o mais eficaz em termos de compartilhamento de informações. Além disso, por estar no meio acadêmico, acredito que a produção de conteúdo científico seja um modo de contribuir para a sociedade, em diversas áreas do conhecimento.

Falando de atividades do dia a dia, procuro desenvolvê-las da forma mais simples e sustentável possível. Desde me deslocar a pé em pequenos trajetos até manter uma horta no quintal de casa. Acredito que ações pequenas realizadas por todos façam uma grande diferença no funcionamento de uma cidade.

Sendo você da área de Arquitetura e Urbanismo, como aplica os conceitos do Programa Cidades Inovadoras através de sua profissão?
Nos últimos anos, venho atuando muito pouco na área de construção civil, direcionando a maior parte das minhas atividades na área de planejamento urbano. Por meio da Redeci participo ativamente de algumas ações do Programa Cidades Inovadoras, como a CICI2011, e menos ativamente em outras ações, como a Rede de Desenvolvimento Local e a Universidade da Cidade. Além disso, procuro promover dentro da rede, junto com outras pessoas, alguns pequenos encontros que estimulem a interação e a divulgação de conteúdo e informação. Em 2010 foi apenas um e tentarei dar continuidade em 2011.

Quais os reflexos positivos que já vem percebendo nos projetos e trabalhos de sua área relacionados ao tema sustentabilidade?
Por atuar em contato com as pessoas (ainda que online) e pesquisar muitos conteúdos, acredito poder dizer que se percebe uma ampliação do conhecimento por parte das pessoas (mesmo que de uma minoria) no tema sustentabilidade. Alguns temas como mobilidade e resíduos aparentemente possuem um poder de persuasão grande, possivelmente por estarem presentes do cotidiano da população. Talvez por estarem insatisfeitas com alguns fatores em suas cidades, as pessoas começam a perceber que suas ações importam, sim, para a qualidade de vida das cidades em que residem.

Em relação à pesquisa, que representa uma parte importante das minhas atividades, acredito poder dizer que a sustentabilidade já vem há alguns anos tomando um espaço importante diante da temática do planejamento urbano e urbanismo.

Poderia falar um pouco sobre sua tese de doutorado acerca da temática de desastres naturais nos centros urbanos?
Meu interesse pela temática do planejamento urbano vem desde a graduação em arquitetura e urbanismo. No meu TFG (trabalho final de curso), na PUCPR, realizei um projeto de requalificação urbana em uma área de habitações subnormais em Curitiba. Em seguida, na dissertação de mestrado (intitulada “Desastres Naturais e Vulnerabilidades Socioambientais: o Caso de Curitiba Paraná“), direcionei meus estudos para a temática da vulnerabilidade socioambiental, que explora aspectos sociais junto com os desastres naturais. Esta pesquisa buscou comprovar a hipótese de que uma determinada parcela da população é mais vulnerável que outras, ou seja, populações inseridas em classes sociais mais baixas são, em grande parte das vezes, mais vulneráveis aos desastres naturais.
A tese que desenvolvo desde 2010 trata de uma temática mais específica. A pesquisa enfoca as geografias da solidariedade, isto é, fatores que influenciam na definição de prioridades para o direcionamento de recursos quando de desastres naturais. O principal objetivo é identificar fatores de diversas ordens (políticos, econômicos, sociais, religiosos etc.), além do sentimento solidário, que influenciam o direcionamento de recursos nestas situações.
Atualmente, além de realizar pesquisa e análise de dados e referências, estou aplicando questionários para agências internacionais de ajuda humanitária e financeira.

Também sobre a CISUS (Curitiba International School for Urban Sustainability)
O programa CISUS visa produzir e compartilhar conhecimentos, idéias inovadoras e competências sobre as cidades sustentáveis. O programa baseia-se nas experiências de gestão urbana da cidade de Curitiba, no saber compartilhado de instituições de ensino renomadas (a PUCPR e a UTC - Université de Tecnologie de Compiègne) e na inovação e procura por melhorias no sistema produtivo (SENAI e FIEP).
Atualmente são oferecidos dois cursos: o de curta duração, que se dará no segundo semestre de 2011 e tem como objetivo apresentar os aspectos mais inovadores do desenvolvimento sustentável por meio da exposição de práticas reais aplicadas em locais diversos; e o de longa duração, a partir de março de 2012, que explora a cidade de Curitiba como um laboratório de formação. Conta com três principais meios: aspectos teóricos e técnicos (UTC, PUCPR, PMC, IPPUC e personalidades convidadas), ateliês de projeto e – seu principal diferencial – a residência técnica em Curitiba.
Beatriz Hummell -Arquiteta e Urbanista

Voltando ao tema 'cotidiano versus arquitetura e urbanismo em nossas vidas', fale sobre o que acha que poderia ser bem melhor e nem percebemos de tão habituados que já estamos.
Acredito que diversos fatores, por fazerem parte da vida cotidiana, perdem um pouco a sua importância diante do agitado dia a dia, principalmente para quem vive nas grandes cidades. Talvez o fator mais atenuante – isso é uma percepção pessoal – seja a questão da saúde e da alimentação. Muitas pessoas acabam por negligenciar a própria saúde em detrimento do trabalho e da falta de tempo.
Falando agora de um fator mais ligado ao meio urbano, acredito que a questão da mobilidade seja a problemática mais evidente. Em uma cidade como Curitiba, onde as redes de transporte público são bastante amplas e bem planejadas, não há necessidade de utilizar veículo próprio para ir a diversos locais, principalmente na área central. A questão econômica atrelada ao transporte também evidencia uma vantagem na utilização do transporte público. 
Contudo, grande parte da população utiliza o carro individual para se locomover dentro da cidade. No Brasil é possível dizer que este comportamento se deva ao ‘desejo’ de adquirir carro próprio, isto é, uma questão de status. Não tenho dados oficiais, mas acredito que estamos em um período de mudança. Em grandes cidades do mundo, como Nova Iorque, a grande parte da população que mora nas áreas centrais utiliza o transporte público e táxis para se locomover dentro da cidade. Os engarrafamentos tornam muito longa – e muito mais cara – a viagem com o carro individual. É possível que, ao caminharmos para uma sociedade mais igualitária social e economicamente, e melhorarmos a qualidade dos nossos sistemas de transporte, a população passe a deixar o carro em casa para ir trabalhar, por exemplo. 
De qualquer maneira, acredito ser necessário que a população não permaneça em uma posição passiva e autocomplacente e perceba que as ações individuais são muito importantes para o funcionamento da coletividade, isto é, se todos utilizarem carros sempre haverá congestionamentos. Simplesmente ampliar as vias e construir viadutos nunca irá resolver esse problema, além de piorar a qualidade de vida dentro das cidades.
Inovação e Sustentabilidade das cidades


Na entrevista que o arquiteto colombiano Gustavo Restrepo concedeu ao EcoD, em uma das respostas ele cita uma tríade de orientações para o desenvolvimento das cidades, como:
Técnicos que conheçam o território e suas regras de densidade e recursos;
• Líderes que trabalhem entre as autoridades municipais para evitar a falta de programação;
• Comunidades ativas em todos os processos de tomada de decisão que envolve os investimentos dos recursos públicos.
Como vê essa tríade sendo aplicada na cidade de Curitiba?  
Acredito que os três atores citados por Restrepo – profissionais, gestores e população (e acredito que seja importante citar também a iniciativa privada) – são de fato necessários para o desenvolvimento de uma cidade. O histórico de planejamento e gestão urbana de Curitiba, que tem várias experiências de sucesso, mostra que há uma integração desses fatores. A campanha de separação do lixo iniciada nos anos de 1990, pioneira no Brasil, mostrou que houve uma integração desses três setores, que foi fundamental para o seu funcionamento. Certamente a participação da sociedade nos processos de tomada de decisão, não apenas em Curitiba, mas em todo o Brasil, ainda é muito tímida. Contudo, acredito que diversas iniciativas – como o projeto Cidades Inovadoras da FIEP – vêm incentivando e ressaltando o papel da comunidade na gestão das cidades, e já vêm esboçando alguns resultados positivos.

O arquiteto Gustavo Restrepo foi convidado pela "Cidade Pedra Branca" para desenvolver um projeto de revitalização na comunidade Frei Damião em Florianópolis.  Estamos caminhando em Curitiba para programas semelhantes?
Projetos de revitalização de comunidade são muito importantes e vêm sendo desenvolvidos, principalmente nos últimos 10 a 20 anos, em diversas cidades brasileiras. Os projetos oriundos de parcerias público-privadas que visam a revitalização de comunidades de baixa renda por meio da integração da sua população com o meio em que vivem são muito positivos, pois procuram propor melhorias para o meio sem deixar de lado as características daquela população. Não conheço a fundo o projeto da cidade de Pedra Branca, mas me parece que é bastante semelhante a outros projetos já realizados de integração comunitária, como o programa Favela-Bairro, do Rio de Janeiro – talvez em uma escala diferente.
No início da entrevista de Restrepo é citado o conceito de acupuntura urbana. Em 2003 o ex-prefeito de Curitiba e ex-governador do Paraná, Jaime Lerner, lançou um livro intitulado “Acupuntura Urbana”, onde discute sobre esse conceito. Fica claro o reflexo da experiência de Lerner na cidade de Curitiba. Este exemplo mostra que o conceito de acupuntura urbana – o planejamento de uma cidade se dá ao longo do tempo e partir de diversas ações pontuais que geram ações subseqüentes – não é novidade por aqui, talvez tenha até mesmo servido de influência para outros projetos.

Mobilidade urbana
Bicicleta
Mobilidade urbana e ciclovias

Pelo o que acompanhei na Redeci, os seus veículos são a bicicleta e o carro.                      
Na realidade os principais meios que utilizo para me locomover são: caminhar, ônibus e carro.
Infelizmente não utilizo tanto a bicicleta quanto gostaria. Não sei se posso dizer que uso mais o ônibus ou o carro, pois se direcionam para fins diferentes. 
Utilizo o transporte coletivo para ir e voltar do trabalho. E também prefiro quando tenho de ir a locais mais centrais, pela dificuldade de acesso de carro (trânsito, estacionamento etc.) e, conseqüentemente, maior tempo para chegar ao destino usando veículo próprio. 
Utilizo o carro quando preciso me deslocar para locais mais afastados e para lazer, principalmente à noite (shopping, bares, restaurantes), de preferência em horários de pouco tráfego. Quando preciso ir a lugares próximos de casa vou a pé e eventualmente de bicicleta.
Bicicletas e mobilidade urbana

Você acha que Curitiba ainda precisa melhorar em quais pontos para que aumente o numero de usuários de bicicleta no cotidiano?
O principal motivo para eu não utilizar a bicicleta mais freqüentemente é a segurança. Não me sinto confortável em trafegar junto com os carros, ônibus e caminhões pelas ruas da cidade. Possivelmente este é um dos principais motivos pelo qual mais pessoas também não utilizarem a bicicleta. Acredito que uma rede de ciclovias mais completa, que atenda mais partes da cidade, incentivaria o uso deste meio de transporte. Além disso, é necessário que motoristas e ciclistas sejam instruídos a fim de possibilitar a utilização harmônica de ambos os meios de transporte na cidade.

Para uma cidade fria e muitas vezes com mais chuva do que sol, a bicicleta não é desconfortável?
Certamente locais com clima mais quente e pouco chuvoso são mais agradáveis para a utilização da bicicleta como meio de transporte. Contudo, a exemplo de países como Dinamarca e Suécia, que apresentam clima bastante frio em vários meses do ano, este fator não deve servir de impeditivo para o uso desse meio de transporte.  Indico a leitura do livro “Bike to Work Book”, disponível (em parte) online, que desvenda vários assuntos relacionados ao uso da bicicleta, inclusive a questão do clima e da chuva.
Mobilidade urbana

E para ir ao trabalho, a bicicleta também não é desconfortável?  
Uso aqui a mesma dica de livro que citei da última pergunta: ninguém precisa apostar corrida para chegar ao trabalho de bicicleta. Se você pedalar no seu ritmo e não exagerar na velocidade, é possível tornar o seu trajeto bem confortável. Para as mulheres que gostam de usar sapatos de salto alto, nada impede de levá-los na bolsa e trocar.
É importante considerar também aspectos de infraestrutura que tornem a utilização da bicicleta mais viável. A adaptação das edificações (como a criação de vestiários e armários para os funcionários) para incentivar o uso da bicicleta como meio de transporte para o trabalho já vem sendo explorada. Por exemplo, neste documento do Green Building Council Brasil, que estabelece diretrizes para adaptação ou construção de edificações para as Olimpíadas de 2016 no Rio de Janeiro, prevê a construção de vestiários e bicicletário para uma porcentagem mínima dos usuários.

Ônibus

ônibus e cidadãos
Por que tem o  hábito de usar o transporte coletivo da cidade? 
Porque é o meio que mais se adéqua a diversos parâmetros: é mais barato e leva praticamente o mesmo tempo que ir de carro, quando não é mais rápido. Além disso, não gosto de perder tempo procurando vagas de estacionamento, além de correr o risco de roubo do veículo. Outra vantagem é poder fazer pequenas caminhadas entre o ponto de ônibus e o destino, escutar música ou ler dentro do ônibus sem preocupação.

Você não acha que o usuário deveria esperar o mínimo possível e, além disso, ter conforto e segurança no ponto de espera? Por quê?
Certamente os modais de transporte coletivo – ônibus, trem, metrô ou qualquer outro – devem oferecer minimamente conforto e segurança aos seus usuários, tanto nos pontos de espera quanto dentro dos veículos. A NBR 14022 (Acessibilidade em veículos de características urbanas para o transporte coletivo de passageiros) e a NBR 15570 (Transporte – Especificações técnicas para fabricação de veículos de características urbanas para transporte coletivo de passageiros) colocam diretrizes para respeitar parâmetros de acessibilidade, segurança, conforto e mobilidade a usuários e condutores. 
É importante lembrar que o transporte coletivo – isto é, que deve servir a todos – é baseado em uma demanda, e deve-se respeitá-la. Se a demanda é muito maior que o serviço oferecido, deve haver um ajuste. Contudo, não é interessante para ninguém que haja desperdício (nem população, nem poder público).
Acredito ser interessante observarmos outras experiências para atualizar o nosso sistema. Por exemplo, na cidade de São Francisco, na Califórnia, os pontos de ônibus são equipados com um aparelho que informa quanto tempo os três próximos ônibus irão demorar. Esta é uma alternativa simples que pode ser útil tanto para o conforto quanto para a segurança: se o ponto está muito cheio, você tem a alternativa de fazer outras atividades dentro do tempo previsto para os próximos veículos chegarem; se você não se sente seguro, pode procurar outro local e retornar dentro do período previsto. Certamente este equipamento não resolve os problemas em sua totalidade, principalmente relativos à segurança, mas dá alternativas inexistentes em nosso sistema atualmente.
Usuários do Transporte Coletivo

O usuário não deveria ter o direito ao conforto de viajar  sentado? 
Não conheço sistemas de transporte que utilizem este tipo de parâmetro.
Ao realizar este tipo de reflexão, é importante apontar alguns fatores que envolvem os padrões e a qualidade dos serviços de transporte público. Segundo a NBR 15570, que se baseia em padrões de conforto e ergonomia, a capacidade máxima de passageiros em pé por metro quadrado em um ônibus biarticulado, por exemplo, é de seis pessoas. 
Obviamente, a parcela da população que possui algum tipo de dificuldade de locomoção e outros casos, como as pessoas idosas, obesos, grávidas, pessoas com crianças de colo etc., deve ter seus locais de transporte adequados e reservados para seu uso. 
Deve-se lembrar, ainda, que todos os veículos utilizam algum tipo de combustível e geram gastos para o seu funcionamento (aquisição, manutenção etc.). Tanto por razões ambientais quanto econômicas, é interessante que o potencial do transporte público seja utilizado ao seu máximo, sempre respeitando parâmetros mínimos, como colocado acima. Exigir que todos os passageiros viajem sentados em trajetos urbanos demandaria um aumento excessivo do número de assentos, provocando problemas para sua logística de funcionamento.
Ao considerarmos a hipótese de que todos os passageiros usuários de transporte coletivo urbano devem realizar suas viagens sentados, é possível dizer que tanto os parâmetros de ergonomia quanto de sustentabilidade, de logística e econômica, ente outros, não são respeitados em sua totalidade ou no seu potencial máximo. Por essas razões possivelmente a viabilização destes parâmetros não é uma opção interessante.
Transporte Coletivo -Curitiba

Qual a sua interpretação para ônibus lotados-principalmente nos horários de pico- onde o usuário não tem condições de esperar por outro, pois corre o risco de atrasar-se? Como poderíamos de fato mudar isso?
Certamente o sistema de transporte coletivo deve ser adaptado à demanda da população que atende. Se apenas os ônibus não são suficientes, deve-se estudar a complementação desse sistema com outros modais, como metrô e transporte leve sobre trilhos.  Contudo, é importante ressaltar que a parcela da população que possui alternativas, como organizar sistemas de carona, utilizar bicicleta ou trajetos a pé, deve fazê-lo. A colaboração dos cidadãos é essencial para o bom funcionamento de qualquer sistema de transporte.

Como arquiteta e urbanista o que acrescentaria para a humanização das cidades?
Acredito que a participação da população seja um fator muito importante para o bom funcionamento das cidades. Como citei anteriormente, não é possível se comportar passivamente e esperar que as soluções apareçam. A interação da população com seus sistemas de governança é fundamental para que o mesmo funcione. Além disso, ao considerar que mais de 70% da população mundial vive em cidades, é importante ressaltar a importância do respeito às diretrizes ambientais e a preservação da qualidade de vida. A convivência harmônica da população entre si e com os sistemas urbanos de gestão está atrelada ao respeito a essas e outras diretrizes, além da interação de seus diversos atores.

Beatriz Hummell 
Doutora e mestre em gestão urbana, arquiteta e urbanista pela PUCPR. Atualmente desenvolve tese de doutorado acerca da temática de desastres naturais em centros urbanos.
Currículo Lattes: 
http://lattes.cnpq.br/1837377255855246