Cristiane Iannacconi é dessas pessoas
cheias de sol e serenamente atentas a tudo que acontece a sua volta. Seria mais ou
menos como: “olhar, refletir e agir”.
A cada dia, mais pessoas assim estão participando de movimentos a favor da sustentabilidade.
A cada dia, mais pessoas assim estão participando de movimentos a favor da sustentabilidade.
A Mestre em Design nos mostra na prática que é
possível sim, viver bem, com conforto e muito bom gosto, respeitando os princípios da
sustentabilidade.
Dos tantos exemplos que Cristiane nos dá, posso citar que ela prova
que é fácil reutilizarmos e/ou reciclarmos o lixo e transformá-lo em belas peças de decoração (muito fashion's, por sinal); prova que é possível vivermos muito bem fazendo uso da
criatividade que está em nós e, no cotidiano, reaproveitarmos diversos materiais que muitos
ainda jogam no lixo.
Cristiane é idealizadora do Grupo Mobiliza na rede social Facebook, em parceria com Monique Futscher, que recentemente concedeu a entrevista Monique constrói pontes verdes, para o Fura-bolha.
O Mobiliza, como está claro em seu
nome, é mais um de tantos grupos que temos, felizmente, e que tem como objetivo
mobilizar a nós, cidadãos, para trocarmos ideias e informações, refletirmos
sobre nossos hábitos e tomarmos consciência que todos viveremos melhor, com mais segurança, paz e amor, cultivando princípios que façam do nosso mundo,
um lugar sustentável.
Nós, cidadãos deste planeta,
estamos cada dia mais e mais antenados nas redes sociais virtuais, espaços que
o advento da internet nos proporcionou. Através dessas redes, encurtamos distâncias
e fazemos boas amizades.
É a energia do amor que tomou posse dessa proposta e,
sua "presença", está cada vez mais forte. Estamos aprendendo a transmutar
medos, egoísmo, egocentrismo e preconceitos, em paz, generosidade, respeito e... muito amor.
Vale a pena ler Cristiane
Iannacconi nesta entrevista, vale a pena saber um pouco mais sobre sua visão de vida e seus projetos, como o blog CICLICCA, o ECOPICNIC, o Movimento Eu quero Coleta Seletiva e o Grupo Mobiliza.
Veremos como ela escreve com esses atos, uma ode ao amor e à vida. Isso é sustentabilidade.
Veremos como ela escreve com esses atos, uma ode ao amor e à vida. Isso é sustentabilidade.
Entrevista
Tem
uma postagem em seu blog sobre o Ano do Dragão (2012), incluindo uma foto da bela
tatuagem que fez em você. Como relaciona o significado sobre o Dragão de Água e
a busca por um mundo sustentável?
O dragão tem uma relação com meu
lado místico, espiritual. É esse aspecto que me faz entender a nossa relação
com as pessoas, os demais seres vivos, o planeta, o universo... Se entendermos
essa conexão, passamos a respeitar mais aos outros e ao meio ambiente. É o
ensinamento mais importante pra mim: amai-vos
e respeitai-vos uns aos outros. Tenho sentido falta disso no mundo. Tb tem que
ter poesia, encantamento. Sou do ano de Dragão pelo horóscopo chinês e meu
signo solar é câncer, ambos relacionados à água. Ela é sagrada para todas as
religiões. Espiritualidade à parte, a água é o elemento primordial da vida. Precisamos
ter mais respeito em relação a esse recurso natural e indispensável à vida, urgentemente e por ai vai.
Como é seu envolvimento com a reciclagem? Por exemplo, confecção de
brinquedos feitos de materiais que iriam para o lixo e outras ações.
Eu vejo as coisas ao meu redor de
maneira diferente. Quando ando pela rua presto atenção nas coisas que as
pessoas jogam fora e imagino destinos diferentes. O que cai na minha mão, se
transforma. Desde usos mais básicos, como reaproveitamento de embalagens de
plástico, tecido, papel para organização da casa e do ateliê de trabalho, até
mesmo para criação de peças únicas para decoração e brinquedos divertidos.
Infelizmente não dou conta de todo material, mesmo tendo reduzido drasticamente
o consumo e boa parte desse material é reencaminhado para estações de coleta
seletiva, catadores e instituições.
Abdiquei de participar do ritual histérico
de compras inventado pelo comércio e sustentado pela mídia para as celebrações do
Natal e outras datas como dia das mães, dia das crianças, etc.
Sou designer e
já trabalhei diretamente com moda e tive uma pequena marca de roupas femininas
que vendia no Babilônia Feira Hype e em outros mercados alternativos na Zona
Sul do Rio. Hoje praticamente não compro roupas a não ser que seja uma
necessidade real. Ás vezes, ganho roupas usadas bem bacanas de amigas.
Quanto
aos aparelhos eletrônicos, só compro novo depois que param de funcionar: nada de
ceder à regra da obsolescência percebida, a maior bullshit. Isso não quer dizer que eu tenha me voltado contra a
própria profissão, mas tenho um novo olhar sobre o design e a moda, principalmente. Estudei na PUC-Rio e lá se trabalha muito bem o design social,
tudo a ver com essa preocupação com o meio ambiente e o próximo. Então, no fim,
mais importante que reciclar é reduzir seu consumo o máximo possível.
Sobre os brinquedos, poderia
citar alguns?
Meu grande xodó é a caixa de
papelão que veio com o fogão de um vizinho e tem rendido muitas brincadeiras
com meu filho. Não foi um aproveitamento feito do dia para a noite, tem sido um
processo, um mix de brincadeiras,
evoluindo assim como nosso aprendizado por uma vida mais sustentável. Se entrar
de um lado é castelo, se entrar por outro é foguete espacial. Já foi suporte
para colagem, desenho, pintura, carimbo... Também funciona como caixa de
brinquedos quando necessário. Melhor do que trabalhar desenfreadamente para
gastar num brinquedo industrializado, caro e que vem cheio de embalagens, é
gastar esse tempo brincando com meu filho.
Manipular esses materiais
maravilhosos que iam para o lixo, nos permitem exercitar a imaginação com as
crianças e isso é bom. Aos três anos de idade meu filho já trazia embalagens
pra mim dizendo que era para fazer uma arte. Dos brinquedos industriais que ele
tem, muitos foram do primo, outros, presentes de família. No final do ano ele
mesmo separa os que serão doados para crianças carentes; então, sabe que tem
que brincar sem quebrar.
Ver
Álbum A Caixa
|
E sobre repensar, reduzir, reusar, o que faz?
Não dá para contabilizar isso. O
aprendizado e a consciência desses conceitos devem ser internalizados ao ponto
de você poder viver isso naturalmente. Não é uma posição radical, mas acabo
incorporando como atitude diante das coisas da vida. A maior dificuldade é
lidar com a regra vigente em nossa sociedade: as pessoas, mesmo as mais
próximas, não entendem essas escolhas. Desde a minha recusa por sacolas
plásticas no mercado, passando pelas roupas usadas, os aparelhos eletrônicos
que não são o último lançamento do momento... Por incrível que pareça, tirando
as pessoas que têm mais ligação com sustentabilidade, me veem como um ET, um peixe fora d’água.
Como surgiu a ideia do ECOPICNIC e qual a proposta dele?
Queria fazer um evento sempre que
o CICLICCA completasse mais um ano. Como o aniversário é no dia 4 de dezembro,
comecei com uma festa de Natal sustentável, e foi demais. Tudo foi pensado para
incentivar as pessoas a reduzirem o consumo e terem mais consciência justamente
em uma época do ano que só se pensa nisso.
Queria mostrar que dá para fazer
uma decoração de Natal bela mesmo usando material reciclável que costumamos
jogar fora. Também quis incentivar quem trabalha com produtos sustentáveis, já
que é a época de compra de presentes. Também foi a minha primeira participação
no Natal Sem Fome da Ação da Cidadania arrecadando brinquedos.
Ver Álbum ECOPICNIC |
No ano seguinte repensei e
percebi que um piquenique seria tão mais adequado que, nos últimos dois anos,
fizemos isso. A ideia de inspirar as pessoas a reduzir o consumo é a mesma: um
parque não tem vitrines e produtos à venda. Brincamos, lanchamos e trocamos
ideias sobre a preservação da vida humana no planeta curtindo sob a sombra das
árvores: tudo a ver! A Monique Futscher do blog Mimirabolantes me acompanha
desde o início no CICLICCA e tem sido minha maior parceira. Ela participou da
primeira festa e dividiu comigo a realização dos dois piqueniques.
Você e Monique Futscher criaram o Grupo Mobiliza. Gostaria que falasse
um pouco sobre seus objetivos e também a respeito da proposta de mobilização
referente o lixo urbano.
Nós somos duas mães de família
trabalhadoras e engajadas tentando realizar sozinhas esses eventos de incentivo
sócio sustentáveis, sem fins lucrativos. Mesmo para o ECOPICNIC, temos toda uma
logística de produção que não é mole. E a gente quer mais, só que precisamos de
ajuda e de parceiros para essas realizações.
O Grupo Mobiliza é uma tentativa
de envolver mais pessoas com os mesmos interesses nessas realizações. A coisa
toda ficou um tempo incubada, mas agora conseguimos lançar no Faceboook e
esperamos ter participações mais engajadas e pessoas interessadas que dividam
tarefas conosco. Que somem. Estamos pensando no bem comum, é isso.
A campanha sobre o lixo é um
apelo que fazemos a todos, cidadãos, indústria, comércio, poder público: somos
todos responsáveis e é possível melhorar a coleta e destino desses materiais,
consequentemente melhorar a qualidade de vida nas cidades. Estou cansada de
andar pelas ruas do meu bairro e ver o lixo jogado por toda parte, é nojento e
triste. A limpeza urbana só funciona bem na Zona Sul, mas por essas bandas do oeste, parece que voltamos à
idade média.
E o seu blog? Por que o criou e qual o motivo do nome Ciclicca?
Tudo começou com a chegada do
meu filho ao mundo. Foi uma gravidez aguardada e planejada com carinho. Decidi
viver ativamente a maternidade e não terceirizar a criação do pequeno. Por
outro lado, não estava disposta a abandonar minhas atividades profissionais.
Ciente de que minha rotina
mudaria, fui impelida a encontrar novos caminhos. Precisava de uma solução que
congregasse meus diversos interesses e produzisse efeito positivo em nossas
vidas. Assim, surgiu o CICLICCA. O nome tem a ver principalmente com ciclo de
vida, tanto o nosso, quanto o dos produtos que produzimos, consumimos e
descartamos.
Como designer, tenho um olhar
crítico sobre as regras vigentes da indústria e comércio baseadas na
obsolescência planejada e percebida de bens de consumo aliada ao imperativo
consumista do marketing. Hoje, quando olho para o CICLICCA, vejo a minha
história, a minha busca, a minha trilha por uma qualidade de vida diferente e sustentável. E poder enxergar esse crescimento é bastante reconfortante.
Sendo você Mestre em Design, qual sua visão sobre “comunicação
sustentável”?
Por incrível que pareça, a
sustentabilidade não é especificamente o meu objeto de estudo acadêmico, mas
obviamente é a minha habilidade com pesquisa e metodologia científica que me
permitem explorar o tema e encontrar soluções. Estudei na PUC-Rio, sob a tutela
dos grandes mestres do design social. Lá tive a oportunidade encantadora de
conhecer a Ana Branco, por exemplo, mãe da alimentação viva e do suco de luz do
Sol. Hoje penso o design sustentável como uma solução que viabilize um projeto
com o máximo de respeito ao meio ambiente, às pessoas e aos nossos recursos
naturais.
Ver: Potes de plástico e vidros |
Qual é a comparação que
faz sobre o respeito à diversidade de ideias com a sustentabilidade?
Seria
utópico acreditar que existe uma solução para os problemas que enfrentamos com
o meio ambiente. Diversidade de soluções é um caminho mais realista. Mobilidade
urbana, por exemplo, não se resolve com melhoria do transporte público ou
ampliação de ciclovias e ciclofaixas, mas com cada uma dessas soluções
combinadas.
Outro
dia li no muro de uma escola a frase “reciclagem é a solução”. Isso é uma
ilusão. A solução está além: é reduzir, reutilizar, reciclar, educar,
socializar, respeitar...
Somos
todos diferentes, é preciso respeitar essas diferenças. Temos que dialogar sobre
as opções e encontrar formas de conviver com mais harmonia. Sustentabilidade e
solidariedade são conceitos pares. Veja bem, não é porque eu não compro roupas
que todos devem fazer o mesmo. Cada um tem que encontrar o próprio caminho,
fazer a sua parte.
O que gostaria de mudar na vida
das pessoas, se pudesse?
Nossa!
Essa pergunta é a mais difícil, rs. Penso que se agirmos com mais consciência,
tendo em vista a sustentabilidade e a solidariedade como premissa, teremos mais
qualidade de vida como indivíduos e como coletividade. Queria que as pessoas
tivessem mais condições de entender seus preconceitos e erros e superá-los a
ponto de colocar o RESPEITO ao próximo em primeiro lugar.
Ver: Carimbos Artesanais |
Você acha o mundo era melhor na
época em que tinha 18 anos?
Se era melhor, eu não sei
te dizer, mas eu tinha menos preocupações, né? Muita coisa mudou. Principalmente
a tecnologia e isso em si têm suas implicações sociais. Mas ainda somos
ignorantes e preconceituosos enquanto sociedade. Quando vejo lixo espalhado
pelas ruas da cidade, acho que ainda estamos na idade média e nos faltam até as
noções básicas de saúde e higiene. E como pode a coleta seletiva ainda ser
considerada inviável? Isso parece ter a ver com a corrupção assumida e impune
que reina no Brasil.
O que acha das pessoas que
optam por uma alimentação vegetariana em defesa dos animais?
Queria
ser como elas, rs. Venho de uma família de carnívoros, mas sempre tive
implicância física e psicológica com carne. Evito ao máximo comer carne
vermelha porque acho que é a pior delas em todos os sentidos. E se pensar pra
valer, além do karma por trás dessa alimentação morta, tem a preocupação com o
próprio futuro dos nossos recursos.
Já falamos da água aqui e sabe-se que para
produzir um boi adulto para abate gasta-se uma quantidade exorbitante de água,
além da área desmatada necessária para o pasto. Mas não consigo deixar de comer
peixe.
Admito
que seja muito difícil a gente ser perfeito e acertar em tudo. Mas a vida é
assim mesmo. O importante é o aprendizado e a consciência de si mesmo e do seu
entorno. É preciso também ter coragem e vontade de mudar, mesmo que
gradualmente, buscar o equilíbrio.
Ver: isopor nos vasos do jardim |
Acha que está conseguindo realizar sua parte
para preservação do planeta com bom humor e leveza?
Com certeza. Fazendo um
bem a gente se sente bem. Gentileza gera gentileza, né? Fui criada na
igreja católica e me diziam que era preciso catequizar as pessoas. Acho que
catequizar é dar bom exemplo fazendo o bem sem olhar a quem, tratando todos com
dignidade e isso não significa falar de religião. Religião enquanto instituição
está mais ligada à política e isso não é, nem de longe, o meu barato.
É
preciso bom humor e leveza para trazer as pessoas para o seu lado, né? Eu não
consigo ser radical, nem consigo ainda fazer tudo que eu acho que preciso fazer
pelo meio ambiente, quanto mais cobrar isso dos outros. Também não sou a dona
da verdade, nem conheço quem o seja. Mas se eu inspirar alguém a fazer algo do
bem, já está de bom tamanho.
É considerada radical sobre
seus cuidados com o meio ambiente? Caso sim, como absorve isso?
Não.
Radicalismo não combina comigo. Busco suavidade, parcimônia, embora haja
momentos em que é preciso ter intensidade. Essa suavidade tem a ver com a
possibilidade de diálogo e de escolha, individualidade e capacidade. Mas sei
que às vezes é difícil lidar com minhas próprias cobranças.
Como relaciona generosidade versus
liberdade?
Acho
que liberdade é um conceito utópico, como a democracia. Quero dizer que nossa
liberdade é cheia de limites. E precisa ser mesmo. A minha liberdade termina
onde começa a sua. Mas as pessoas não estão nem ai para isso e passam por cima
umas das outras, estão mais para “os incomodados que se mudem”, mas não pode
ser assim. A generosidade está ai, em você ter a consciência de que não é o
centro do universo e que precisa respeitar os demais, porque o que você faz
afeta os outros.
|
E
generosidade versus sustentabilidade?
Generosidade
tem tudo a ver com sustentabilidade. É justamente o que eu falo, de ser capaz
de enxergar a sua relação com os demais seres vivos e não deixar de fazer o bem
que pode fazer. Cuidar do meio ambiente é fazer um bem coletivo.
Acha que pode existir sustentabilidade sem
liberdade? Por quê?
Não.
Para ser sustentável é preciso ser culturalmente aceito. Aceitação é diferente
de imposição, daí a relação com a sustentabilidade.
Quais as nossas atitudes que considera uma
contribuição para que todos vivam bem?
Respeito
e generosidade são a base. E respeito, independente de sexo, idade, raça,
crença, nacionalidade, poder aquisitivo, etc.